Os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula
da Silva, e da Colômbia, Gustavo Petro, vão conversar sobre situação política
na vizinha Venezuela, após as restrições eleitorais a opositores, e sobre a
guerra na Faixa de Gaza. Os assuntos estão na pauta da visita do brasileiro a
Bogotá, na semana que vem. Lula e Petro adotaram um tom semelhante sobre os
dois assuntos nas últimas semanas, com críticas ao regime do aliado Nicolás
Maduro, e comparações entre o Holocausto e a ação militar de Israel contra o
grupo terrorista Hamas, no território palestino.
Lula e Petro terão uma reunião privada para debater Venezuela e o conflito
entre Israel e o Hamas na Casa de Nariño, sede da presidência colombiana, no
dia 17 de abril. O momento será dedicado a temas políticos sensíveis e a um
balanço das relações entre os dois países. O formato previsto inclui a presença
somente de presidentes, primeiras-damas, chanceleres e embaixadores de cada
lado.
Lula e Petro vão conversar ainda sobre o "Consenso de Brasília",
documento assinado após a reunião de presidentes sul-americanos em maio
passado, e sobre os rumos da Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e
Caribenhos), que será presidida pela Colômbia em 2025.
Já durante a reunião ampliada, os presidentess que vão passar por uma série de
temas políticos, econômicos e de cooperação, como a compra e venda de produtos
a base de maconha medicinal, a transferência de conhecimento para produção da
vacina da dengue, a interligação energética regional, de fibra ótica na
Amazônia e a retomada de um corredor bioceânico intermodal.
Os governantes e suas equipes pretendem conversar sobre a implementação da
Declaração de Belém (PA), assinada em agosto do ano passado depois de uma
cúpula sobre a Amazônia convocada por Lula. A exploração do petróleo na região
opõe os presidentes. Ambos vão discutir sobre a proteção florestal e as
perspectivas para a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA).
Maduro
Ambos são aliados políticos históricos do ditador venezuelano, Nicolás Maduro,
e emprestaram prestígio político para reabilitar o chavista internacionalmente.
Ambos restabeleceram relações com o governo do país vizinho depois de
presidentes anteriores cortarem laços. No entanto, passaram a fazer críticas inéditas
em público, depois que a principal força de oposição venezuelana foi impedida
de disputar as eleições presidenciais.
Maduro rebateu o tom mais crítico do brasileiro e do colombiano. Ele chegou a
falar que as cobranças internacionais eram parte de um "circo".
A mudança de postura em relação a Caracas ocorreu porque a principal candidata
de oposição nas eleições marcadas para 28 de julho, Corina Yoris, não conseguiu
se inscrever no pleito. Ela havia sido escolhida de última hora, depois que o
regime bolivariano insistiu em inabilitar a vencedora das primárias da
Plataforma Unitária, María Corina Machado.
Lula e Petro haviam criticado pela primeira vez de forma dura o aliado Maduro,
pela restrição da candidata Yoris, o que não recebeu explicações razoáveis,
segundo o petista. Petro afirmou que havia um "golpe antidemocrático"
em Caracas. Lula determinou uma nota do Itamaraty e classificou a situação como
"grave".
Desde que assumiram o poder, Lula e Petro envolveram-se pessoalmente em
promover um entendimento entre o chavismo e opositores. Eles participaram de
conversas telefônicas e até presenciais com representantes de Maduro e com o
próprio ditador Nesta quarta-feira, dia 10, Petro e Maduro se reuniram em
Caracas. Ele pediu por "paz política" na Venezuela.
Israel
Lula e Petro também acumulam crises diplomáticas com Israel. Ambos convocaram
seus embaixadores de volta a Brasília e a Bogotá, em decorrência de
discordâncias políticas e repúdio à guerra que o governo israelense promove na
Faixa de Gaza, como reação ao ataque do grupo terrorista Hamas, em 7 de outubro
do ano passado.
O petista passou a ser considerado persona non grata no país depois que
comparou a campanha das Forças de Defesa de Israel (FDI) na Faixa de Gaza ao
holocausto. Durante viagem à Etiópia, em 18 de fevereiro, ele dissera que
"o que está acontecendo em Gaza não aconteceu em nenhum outro momento
histórico, só quando Hitler resolveu matar os judeus".
Lula se recusou a pedir desculpas, exigidas por Tel Aviv, e costuma insistir em
considerar que o governo israelense promove um "genocídio" de
palestinos. Ele apoiou o processo contra Israel, denunciado por genocídio, pela
África do Sul, perante a Corte Internacional de Justiça (CIJ).
Em março, Petro aderiu à retórica inaugurada por Lula na arena internacional.
Ele mandou suspender a compra de armamentos israelenses, também falou em
genocídio e comparou as ações militares de Israel ao holocausto, quando cerca
de 100 palestinos foram mortos a tiros por disparos das FDI, enquanto buscavam
comida famintos num comboio de ajuda humanitária.
"Pedindo comida, mais de 100 palestinos foram mortos pelo
(primeiro-ministro israelense Binyamin) Netanyahu. Isso é chamado de genocídio
e lembra o Holocausto, mesmo que as potências mundiais não gostem de
reconhecê-lo", escreveu Petro em uma publicação em sua conta na rede
social X, onde republicou uma mensagem de outra conta com um vídeo do massacre
mostrando dezenas de corpos empilhados.
O colombiano ameaça romper relações com Tel Aviv se o governo Benjamin
Netanyahu seguir descumprindo a determinação de cessar-fogo do Conselho de
Segurança das Nações Unidas. Lula já fez cobranças similares e acusou Israel de
ignorar as determinações liminares da CIJ, a fim de prevenir o genocídio e
crimes de guerra.
Aliança
Lula e Petro são aliados políticos. O colombiano foi o primeiro presidente de
esquerda a chegar ao poder em Bogotá.
Esta será a primeira visita bilateral do presidente Lula a um país
latino-americano em 2024, um sinal de prestígio diplomático, e a segunda vez no
atual mandato. Ele foi a Letícia, cidade colombiana que faz fronteira com
Tabatinga (AM), no ano passado, para uma conferência científica amazônica.
Desde que tomou posse, o petista esteve em Argentina, Uruguai, Paraguai,
Colômbia, Cuba, Guiana, São Vicente e Granadinas - na maior parte das vezes
para participar de cúpulas de chefes de Estado e de governo.
Petro, por sua vez, veio três vezes ao País: na posse de Lula, na reunião de
presidentes sul-americanos que almejava revigorar a Unasul e na Cúpula de
Belém. Ele aproveitou as vindas ao Brasil para estender a Lula o convite e
anunciar que o País seria homenageado na feira do livro. Os dois também se
encontraram em Dubai, durante a COP28, maior encontro climático do mundo.
Em meados de maio, Lula avalia viajar ao Chile - para a segunda reunião de
presidentes sul-americanos - promovida pelo presidente Gabriel Boric e esticar
a passagem nos Andes na Bolívia, a fim de se encontrar com o presidente Luis
Arce. O petista também irá ao Paraguai em junho, para a reunião semestral do
Mercosul.
Fonte: Estadão conteúdo
Foto: Cláudio Kbene/PR