ara além dos atributos pessoais de Helder Barbalho, há fatores objetivos atuando contra a sua pretensão de estender seu mando e governança por mais quatro anos. É certo que a correlação de forças na política lhe é favorável. A oposição formal tem baixa capilaridade social e se divide em ultra-direita e ultra-esquerda, sem unidade de fala ou ação que pareça colocar em risco as pretensões do mandatário. O personagem principal de uma oposição moderada, Daniel Santos, prefeito de Ananindeua, ainda é um personagem metropolitano e precisará se desdobrar para superar suas próprias fronteiras.
A análise do Índice de Progresso Social (IPS) de 2023, que aponta o Pará como o Estado com a pior qualidade de vida do Brasil, por exemplo, revela um contraste gritante entre a percepção pública e a realidade socioambiental da população. Esse abismo não deveria ser ignorado, porque pode ser o fator determinante na sucessão governamental, minando a capacidade de transferência de votos e apoio político de Helder para Hana Ghassan, sua escolhida.
Dilema da popularidade
Helder Barbalho é, inegavelmente, o governador que manteve por mais tempo os índices de aprovação elevados, em média acima de 50%. Seus antecessores oscilaram bastante, a depender das intempéries políticas e das vicissitudes da hora.
Os índices de aprovação de Helder o colocam em posição de destaque no cenário político, inclusive nacional, sendo regionalmente uma referência cuja imagem se impõe. No entanto, o IPS, ferramenta desenvolvida por cientistas de Harvard e do MIT, que avalia a qualidade de vida a partir de doze componentes em três dimensões - Necessidades Humanas Básicas, Fundamentos do Bem-estar e Oportunidades -, mostra que, por trás do tapume e fora das redes sociais, o quadro é alarmante. O Pará ocupa a última posição entre os Estados brasileiros, com Belém, a capital e anfitriã da próxima COP30, em uma modesta 22ª colocação entre as capitais. O Brasil tem 27 capitais.
A situação é ainda mais crítica quando se observa que doze das vinte cidades com pior pontuação no IPS são paraenses, incluindo municípios como Jacareacanga, Bannach e São Félix do Xingu.
Essa desconexão entre a percepção pública da gestão e os indicadores de progresso social representa um calcanhar de Aquiles para os planos de sucessão de Barbalho. A população, embora possa aprovar a figura do gestor por diversos motivos - desde a comunicação profusa e o culto à personalidade, até a entrega de obras pontuais -, vivencia diariamente as deficiências em áreas vitais como nutrição, saneamento, moradia, segurança, acesso à educação e saúde. Essa dissonância tende a gerar um sentimento de frustração ou descrença que, em um momento eleitoral, pode se traduzir em resistência a um candidato que represente a continuidade do projeto político. Quem lembra das eleições de 2024 lembra do susto que o governador tomou em Santarém, das derrotas em Marabá e Parauapebas e do segundo turno inesperado em Belém.
Desafios na transferência
A alta aprovação de um governante nem sempre se traduz em um caminho pavimentado para a eleição de um sucessor. Em 2002, Almir Gabriel, apesar de desfrutar de alta popularidade durante seu mandato, sofreu para eleger seu sucessor direto, Simão Jatene, que, largando na frente nas pesquisas, teve que disputar um segundo turno dificílimo contra Maria do Carmo, a candidata do PT, hoje deputada estadual. Em 2006, Almir Gabriel tentou voltar ao governo para suceder a Jatene e, mesmo com o apoio da máquina e o legado de seu governo exitoso, perdeu para Ana Júlia, do PT.
A capacidade de transferir votos é um fenômeno que carece de análise detida. Assim como nas transfusões de sangue, não basta que o doador esteja em condições de fazê-lo; o receptor precisa estar apto a receber. Hana estará? A transferência é influenciada por fatores que vão além da mera popularidade do antecessor. No caso do Pará, os dados do IPS e do IDH expõem vulnerabilidades significativas que, por mais que sejam mitigadas por ações governamentais, ainda persistem como desafios estruturais.
O fato de o Pará concentrar os piores índices de qualidade de vida, especialmente em áreas rurais e municípios mais afastados, demonstra que as políticas públicas não estão atingindo a totalidade da população de forma equitativa, o que aumenta a sensação nas regiões mais afastadas de que o governo trabalha “apenas pela capital”. Essa disparidade regional enfraquece o argumento de continuidade, trabalho e progresso, tornando mais difícil convencer o eleitorado de que uma sucessora ou sucessor, mesmo aliado, será capaz de reverter um cenário tão adverso. A memória coletiva das deficiências em serviços básicos, das dificuldades de acesso a oportunidades e da baixa qualidade do meio ambiente pode pesar mais do que a imagem positiva pessoal do atual governador.
Além disso, existe “a bronca”. Há uma percepção equivocada sobre “ascensão da direita” e “decadência da esquerda” como se vivêssemos na Suécia ou na França, onde esses conceitos são consensuais. No Brasil, a maioria das pessoas não sabe o que é isso. Algumas até pensam que sabem. Mas não sabem. O que existe como fenômeno global é o voto da “bronca”, da raiva. O próprio Donald Trump foi eleito com base no mesmo princípio. Os americanos comuns estavam sendo ignorados e desprezados pelas “elites dirigentes”, martelou Trump, explorando sentimentos negativos de rejeição e inferioridade.
A crescente mobilização da população sobre questões sociais e ambientais - a ocupação da Seduc por indígenas serve de exemplo -, impulsionada em parte pela visibilidade que a COP30 trouxe ao Pará, pode levar a um escrutínio maior sobre as promessas e resultados da preferida do governador, a vice-governadora. Num ambiente de raiva e ressentimento, um sucessor que se apresente apenas como um continuador de um projeto político, sem um plano robusto e crível para enfrentar os problemas expostos pelo IPS e pelo IDH, pode encontrar resistência. O eleitorado, cada vez mais desconfiado, busca avais concretos da melhoria da qualidade de vida, e não apenas da manutenção do status quo político.
Contexto da COP30
A realização da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025, também chamada de COP30, em Belém, apesar de ser uma conquista e uma oportunidade de projeção para o Estado, também funciona como uma lupa sobre suas vulnerabilidades. A atenção global voltada para a Amazônia e, consequentemente, para o Pará, trouxe à tona não apenas o potencial da região, mas também seus desafios ambientais e dívidas sociais. Os índices negativos de desenvolvimento humano, que já são conhecidos internamente, ganharam uma projeção internacional.
Essa exposição pressiona ainda mais o debate político local. O principal candidato da oposição, Daniel Santos, terá um arsenal de dados para questionar a eficácia das políticas atuais e a capacidade do governo em transformar os indicadores de qualidade de vida. A narrativa de "progresso" e "desenvolvimento" que um candidato governista tentará construir pode ser descredibilizada pelos números, que apontam para uma realidade de deficiências estruturais.
A popularidade de Helder Barbalho é um ativo político considerável? Sem dúvida. Mas não é um cheque em branco para a sucessão. Os dados estatísticos revelam um Pará com profundos desafios, e essa realidade pode ser o principal obstáculo para a ascensão de um sucessor que se apresente como mera continuidade. O próximo pleito no Estado promete ser um teste da capacidade de um governante em traduzir aprovação popular em transferência de poder, especialmente quando os indicadores de qualidade de vida da população alimentam a bronca e clamam por mudanças estruturais e urgentes.
Em 2026, a disputa no Pará não será entre direita e esquerda, como esperam alguns. É menos óbvio que isso. Aqui, o subjetivo e o objetivo é que disputarão o imaginário. Quem vencer vestirá a faixa.
Papo Reto
•O embaixador André Corrêa do Lago (foto), presidente da COP30, deve estar de cabelo em pé. Várias embaixadas brasileiras encaminharam aos organizadores do evento, que acontece em novembro deste ano, preocupações de governos estrangeiros sobre em Belém.
•O Itamaraty tomou conhecimento de reclamações de cinco países: Alemanha, Dinamarca, Reino Unido, Noruega e China. As principais questões são hospedagem e logística - assuntos ainda pendentes pela organização da COP30.
•Quem deve estar gostando disso é o ministro chefe da Casa Civil do governo Lula, Rui Costa, que faz carga contra a COP30 desde sempre.
•O ministro foi contra a indicação de Belém desde o princípio e jamais se conformou com o que considera “decisão solitária” - palavras dele, segundo dizem - do presidente Lula.
•Para ele, Salvador, São Paulo ou Rio - nesta ordem - teriam condições de abrigar o evento sem percalços. Costa considera a empreitada “cara e sem retorno eleitoral”. O Pará tem apenas 3,9% dos eleitores do País.
•Até a chegada da COP30, conferência de nível internacional, Belém promove três conferências climáticas em nível municipal, estadual e nacional. Semana próxima é a vez das escolas da Semec e Seduc, que devem apresentar delegados e propostas para a conferência nacional, em Brasília, prevista para outubro.
•O governador do Paraná, Ratinho Jr., deve vir ao Pará para uma agenda do Podemos. A ideia é visitar Belém e Santarém. Tempos difíceis para Ratinho...
•Correios, a situação é tão crítica que passa a seguinte impressão: o sujeito está aposentado, portanto, pode encarar uma espera de até seis horas, até que os sistemas de controle com o INSS se combinem para oferecer o atendimento necessário.
•Acontece em Belém, e região metropolitana e afeta principalmente os serviços oferecidos via Sedex. Cobrados por clientes, carteiros têm a justificativa na ponta da língua para tanta demora: a empresa não pagou a transportadora.