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Franceses se revoltam com diretor que comparou Napoleão a Hitler e Stalin

Ridley Scott, diretor de Blade Runner, Gladiador e Alien, está em fase de finalização do longa que contará a história de uma das figuras mais emblemáticas da França. Filme tem previsão de lançamento para novembro deste ano.

28/08/2023 12:46
Franceses se revoltam com diretor que comparou Napoleão a Hitler e Stalin

Era o início de sua campanha, e o veterano britânico disparou uma saraivada de tiros contra as linhas francesas. Estamos falando de Ridley Scott, diretor que está promovendo seu mais recente filme, com estreia prevista para novembro.

"Napoleão" promete ser um relato épico da ascensão do imperador, interpretado por Joaquin Phoenix, com foco no relacionamento volátil dele com a primeira esposa, Joséphine - interpretada por Vanessa Kirby.

Mesmo ainda faltando meses para vermos o resultado final, a conversa começou a girar em torno da cinebiografia, graças aos comentários feitos pelo diretor em entrevista à revista de cinema Empire.

"Eu comparo [Napoleão] com Alexandre o Grande, Adolf Hitler, Stálin. Veja, ele tem um monte de merda sob sua responsabilidade", declarou Scott, explicando sua opinião sobre o personagem.

Os franceses não perderam tempo em responder ao ataque e corrigir o britânico. "Hitler e Stálin não construíram nada e apenas causaram destruição", disse Pierre Branda, diretor acadêmico da Fundação Napoleão, ao jornal britânico The Telegraph.

"Napoleão construiu coisas que ainda existem hoje."

Thierry Lentz, da Fundação Napoleão, disse no mesmo artigo: "Napoleão não destruiu nem a França nem a Europa. Seu legado foi posteriormente celebrado, abraçado e expandido.”


Trajetória de Napoleão


Então, qual é a verdade sobre o assunto? A opinião de Ridley Scott tem fundamento?

Napoleão, um brilhante comandante militar, tomou o poder em 1799 durante um período de instabilidade política na França após a Revolução Francesa. Seus admiradores dizem que ele fez da França um país mais meritocrático do que fora sob o ancien régime (antigo regime) pré-revolucionário.

Ele centralizou o governo, reorganizou os bancos, reformulou a educação e instituiu o código napoleônico, que transformou o sistema jurídico e serviu de modelo para muitos outros países. Mas ele também travou uma série de guerras sangrentas pela Europa, estabelecendo um império que, no auge, se estendia da Península Ibérica a Moscou.

Em 1812, as únicas áreas da Europa livres de seu controle, por governo direto ou fantoche ou por aliança, eram a Grã-Bretanha, Portugal, Suécia e o Império Otomano.

Ele foi finalmente derrotado em 1815 por uma aliança de nações lideradas pela Grã-Bretanha na Batalha de Waterloo. Napoleão e as Guerras Napoleônicas ocuparam as mentes dos britânicos desse período e além.


Alguns pontos de vista


Philip Dwyer, professor de história na Universidade de Newcastle, na Austrália, e autor de uma biografia sobre Napoleão em três volumes, acredita que não.

"Você pode ter um debate sobre se Napoleão era um tirano ou não - eu estaria inclinado para o tirano -, mas ele certamente não era Hitler ou Stálin, dois ditadores autoritários que reprimiram brutalmente seu próprio povo, resultando em milhões de mortes."

"Alguns chegaram a argumentar que o Império [Napoleônico, que durou de 1804 a 1814] era um 'Estado policial' porque havia um complexo sistema de informantes secretos que vigiavam a opinião pública", continua ele.

"Mas muito poucas pessoas - vários aristocratas mais ou menos envolvidos em conspirações para derrubar o regime, alguns jornalistas - foram executadas por Napoleão por sua oposição. Se eu fosse comparar Napoleão a alguém, voltaria na história a Luís 16, um monarca absoluto que travou guerras desnecessárias que custaram milhares de vidas", acrescenta o pesquisador.

"Da mesma forma, Napoleão travou guerras - novamente, é discutível se foram necessárias ou não - custando a vida de milhões de pessoas, embora não saibamos quantos civis foram mortos direta ou indiretamente como resultado dessas guerras."

A jornalista francesa e colunista do Telegraph Anne-Elisabeth Moutet concorda que Napoleão não é comparável a Hitler ou Stalin.

"Ele [Napoleão] não tinha campos de concentração", diz ela à BBC Culture. "Ele não escolheu minorias para massacre. Sim, havia uma polícia política intrusiva, mas as pessoas comuns podiam viver como quisessem e dizer o que quisessem.”

Claro, Ridley Scott, um titã da indústria cinematográfica, diretor de Blade Runner, "Gladiador", "Thelma e Louise”, "Alien" e muitos outros, está no ramo há tempo suficiente para saber como promover um filme.


(Com CNN e Folha)

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